Dia 19, Bacuriti > Sabino
Percurso: Represa de Promissão, Rio Tietê
Início: Bacuriti, gramado/praia na represa
21° 33.680’S 49° 24.948’W
Final: Sabino, Pomar de mangas
21° 24.807’S 49° 35.509’W
Percorrido hoje: 25.0 km
Total acumulado: 442.3 km
Caribe Fluvial
Alessandro – Mais um dia de águas espelhadas. Promissão realmente foi com a nossa cara e facilitou nossa navegação. A gigante gentil! Um mar, literalmente. Percorremos trechos longos onde o horizonte era apenas água. Pontos distantes que avistávamos demoravam até 3 horas para chegar. A compensação foi quando, ao chegarmos num ponto de descanso, encontramos uma praia de pedras com águas transparentes. Lugar para se voltar um dia. Esse lugar tem água limpa e cristalina e fundo de pedras e areia parece coisa de Caribe ou qualquer praia linda em uma beira mar. O sol forte fez por merecer um refrescante mergulho!
Um caso curioso aconteceu quando estávamos buscando algum lugar para acampar no final da tarde. Tem sido assim: Todos os dias, tipicamente, a gente começa a ficar de olho em algum lugar pra acampar a partir do meio da tarde. Se estivermos passando por lugares onde encontramos pessoas nas margens, a gente pergunta, se o lugar for legal, se podemos acampar por lá. Uma clareira plana na margem, com grama, já é tudo de bom pra gente. Essa tarde passamos por um lugar assim, e lá tinha um cara fazendo não sei o quê. Cumprimentei ele, ainda de dentro da canoa, ainda dentro do rio, mas bem perto da margem, e perguntei se poderíamos acampar lá. Ele olhou pra gente com certo desprezo, quase querendo ignorar e virar a cara. Aguardei resposta, e aí ele respondeu de maneira grosseira, “Não, aqui não” abanando com a mão no ar como se dissesse continue indo pra lá, rio abaixo. Foi uma reação diferente da maioria das pessoas que encontramos. E é aí que a gente percebe a incapacidade de discernimento de algumas pessoas. A vibe desse cara era de tamanha ignorância que nem perdi tempo tentando explicar a situação ou insistir de qualquer forma. Minha reação foi querer mesmo aumentar a distância entre a gente e aquele sujeito imediatamente. Um sujeito que em menos de um minuto conseguiu expressar de alguma forma tanta negatividade. Parece exagero, mas foi isso mesmo. A impressão que eu tenho é que esse cara nos tomou por algum tipo de andarilhos (não considero esse termo pejorativo, mas acho que na cabeça dele qualquer coisa associada a isso seja negativa), de sem terra, de sei lá o quê. E já com esse preconceito nos “enxotou” ao seu modo, dispensando até qualquer conversa inicial. Creio eu que em sua limitada cabeça e espírito ele não enxergou na gente viajantes honestos de bem sem nenhuma má intenção. É estranho passar por situações assim, onde te enxergam de uma maneira preconceituosa. Lamento, pois o mundo pequeno está dentro da cabeça dele. O meu mundo, maior, é aqui fora.
No final do dia achamos uma prainha e acampamos num pomar de mangas de um rancho ribeirinho. Lá conhecemos o caseiro Nelson que tinha um cágado preso a uma estaca. O coitado do bicho estava preso com um arame na beira da água. Fiquei meio revoltado vendo aquilo, com dó do bicho, e queria imediatamente soltar o arame que passava por um furo em seu casco. Mas é uma situação delicada você chegar de fora querendo dizer como devem ser as coisas para uma pessoa de acordo com seus próprios valores. Por mais que a gente tenha nossos argumentos, é um dilema se impor ou não. Questionei de maneira tranquila o porquê daquela tartaruga estar presa a um arame daquele jeito. E descobri que era infelizmente fruto da ignorância das boas intenções do Sr. Nelson: Ele me respondeu, assumidamente sem graça e com um certo sentimento de culpa, que prendeu o cágado pra mostrar pras crianças, seus netos, quando elas viessem visitar. Tem alguém que disse que o inferno está cheio de boas intenções?
A noite nossa refeição foi mais uma variedade de comida liofilizada: Um macarrão com molho quatro queijos e frango desfiado. Estava gostoso, mas nem se compara à excelente comida da minha mãe.